Sunday, April 16, 2006

“Forget Mars and Venus. Americans live on risk. Europeans must have security.”
Roger Cohen, NY Times

O autor acima citado argumenta que as manifestações das últimas semanas em França contra a nova lei laboral e a de segunda-feira nos Estados Unidos por imigrantes ilegais a exigir direitos sociais e de cidadania são o reflexo perfeito das duas faces da globalização.

Com a globalização económica, e crescimento da China e Índia, a Europa encontra-se actualmente perante um dos maiores desafios ao seu modelo social. Embora este tenha sido responsável por providenciar os maiores níveis de qualidade de vida da história numa região do mundo, a estagnação económica e altas taxas de desemprego que as suas principais economias apresentam, demonstra cada vez mais a sua incapacidade competitiva numa economia global desregulada e dos seus estados providência em garantir os direitos sociais que constituem a base da sua formação.

Embora a necessidade de mudança seja consensual (agenda de Lisboa), as recentes eleições alemães e italianas (onde o eleitorado praticamente se dividiu ao meio, paralisando as economias dos dois países) e principalmente as manifestações francesas demonstram a renitência dos cidadãos europeus em abdicar dos direitos sociais e segurança providenciados pelo estado, e principalmente a incompetência dos seus líderes em promover as mudanças necessárias para não pôr em causa o seu lugar.

O caso francês é neste aspecto especialmente paradigmático. Em reposta directa aos tumultos nos subúrbios de Paris, o governo de Villepin introduziu na lei laboral francesa um contracto (a juntar aos 17 existentes) que permitiria aos empregadores despedir trabalhadores até aos 26 anos nos primeiros dois anos de contracto sem justificação. A intenção desta alteração era lidar com a taxa de 22% de desemprego que atinge o extracto etário referido, cuja realidade social os tumultos expuseram. A proposta nem sequer era nova e tinha sido já introduzida no Reino Unido, Suécia, Holanda e até na Alemanha por Gerard Schroder, um Social Democrata. Como é sabido, isto originou um protesto violentíssimo por parte dos estudantes universitários (a maioria dos quais terá mais de 26 quando acabar o curso) e pelos sindicatos, que viram aqui uma oportunidade para justificarem a sua utilidade.

A França, com a recusa da liberalização do mercado de trabalho a nível Europeu, a reformulação da Política Agrícola Comum, a Constituição Europeia e até a introdução de uma alteração mínima da sua rígida lei laboral, representa actualmente o principal travão à competitividade da Europa. Chirac, ao voltar a dar mais importância à sua carreira política do que ao futuro do País e da UE, voltou a demonstrar a sua enorme incompetência e a adiar consequências que concerteza serão mais graves. Mais ainda, a mim nunca me deixa de surpreender o comportamento paradoxal e hipócrita desta esquerda europeia também presente em Portugal, que para viabilizar a sua existência, assume o papel de defensor das corporações públicas, pondo em causa todos aqueles que não têm acesso a um emprego no sector público, resultando ironicamente num aumento da polarização social.

Este processo é especialmente latente, quando deste lado, milhares de pessoas arriscam diariamente tudo pela possibilidade de trabalhar em condições miseráveis e sem qualquer tipo de direitos sociais, apenas para poderem providenciar melhores condições de vida às suas famílias. Neste sentido, as manifestações de segunda-feira foram uma manifestação monumental da hipocrisia política que gere o País, cuja competitividade económica assenta exactamente na possibilidade de explorar esta imensa mão-de-obra sem qualquer obrigação por parte do governo ou empresas em providenciar condições mínimas sociais e de trabalho. Este “pragmatismo” Americano permite que se continue a permitir conscientemente que milhares de pessoas passem as suas fronteiras ilegalmente de modo a serem exploradas e até que milhões de pessoas que à luz da lei americana cometeram um crime, possam manifestarem-me livremente na rua sem que nada lhes aconteça.

Que pensaram eles da Europa ao perceberem as razões pelas quais os estudantes franceses se manifestavam?

Especialmente irónico para mim é ao mesmo tempo ver o sucesso de países como a Irlanda, Suécia e Holanda que de facto desregularam os seus mercados de trabalho e agora conseguem ter crescimento económico e emprego, num contexto de redistribuição e altos níveis de gastos sociais.

O lugar de Chirac, ou dos líderes sindicais é assim tão importante?

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